Nem tudo começou com a chegada de certo grupo económico a Abrantes. O trabalho marxista já estava feito. Desvalorizar o conceito da propriedade privada foi o primeiro acto. Criar todas as dificuldades a quem quisesse construir a sua casa própria foi a segunda grande machadada nas gentes de Abrantes. Num ápice, os pinheiros e os eucaliptos cresceram. Os fogos passaram a actividade permanente. E depois dos fogos apareciam os "compradores" da terra queimada, a quererem levar pela metade a terra onde se carregavam os toros chamuscados para as celuloses, também por metade do preço. Eram "saldos" a toda a hora, sem que muitos percebesse bem, a quem aproveitava o negócio, apesar de algumas forquilhas terem corrido atrás desses "meirinhos", num claro sinal da revolta e da indignação populares.
É bom que se diga, que a submersão de cerca de 660 hectares pelas águas da albufeira do Castelo de Bode podiam ter gerado outras mais-valias para as populações, se não vivêssemos numa ditadura nos anos de 1950. Desde logo, com muita água disponibilizada, através de captações públicas. Tinha sido o mínimo que se devia ter oferecido a quem ficou com as suas terras devastadas.
A "carta a Salazar" do Bispo D. António Ferreira Gomes ainda demoraria oito anos a ser escrita. Muita da indignação que fez ver a Salazar, pelo "estado da nação" podia ter toda a sua razão de ser, nos exemplos das pobres gentes do norte do concelho. Mas se foi motivada pelo o que esse mesmo bispo viu nessas paróquias, quando nos anos de 1950 a 1952 chefiou a Diocese de Castelo Branco e Portalegre, então só a conclusão é fruto da sua própria contrição, a avaliar pelos infelizes comentários que teceu nesses anos das inundações da barragem, sobre essas gentes desesperadas e carentes. Comentários e queixas escritas às autoridades locais ( Major Machado, presidente da Câmara, à época) que não foram as mais desejadas e as mais dignas, que se esperavam de um alto sacerdote, com as responsabilidades sobre essas paróquias abandonadas e tristes. Até nisso, as gentes do norte do concelho sofreram, como que fazendo crer que um mal quando vem, nunca vem só...
Alguém muito velhinho ( com mais de 90 anos ) me contou ainda há poucos anos, de que o seu pai lhe contava que na meninice dele ( entre 1880 e 1900) desde a Igreja das Fontes até S. Domingos, Carvalhal e Souto só se viam terras de castanheiros. Era assim o Souto. Um souto é isso mesmo: terra de castanheiros.
Houve um mal que os atacou. Mas a vinha no Douro também sofreu de uma praga e hoje continua a ser o que sempre foi, e com maior valorização acrescida.
Foram muitos azares seguidos e consentidos.
