Quem o afirma - no PÚBLICO - é Rui Serôdio, psicólogo e professor da Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto.
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«Nada de substancial mudou, o desemprego agrava-se.
Expliquemos.
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«Nada de substancial mudou, o desemprego agrava-se.
Expliquemos.
A crise continua a fazer sentir-se na sociedade portuguesa. Basta olhar para a taxa de desemprego, que é de 9,1 por cento e que a OCDE estima que atinja os 11,7 por cento em 2010. Mas, desde 27 de Setembro, o assunto quase desapareceu dos jornais e das televisões e também do discurso político e comunicacional em geral.
Lembrando a técnica do duche escocês, de um momento para outro, após o calor do debate, surge o silêncio de gelo.
Isto quando, há um ano, olhando para o discurso político e institucional, tudo fazia crer que não haveria grandes consequências da crise em Portugal, quando aquela já se tinha tornado incontornável, após a falência do Lehman Brothers, a 15 de Setembro de 2008.
A crise só entraria no discurso oficial do primeiro-ministro a 6 de Janeiro de 2009, quando, numa entrevista a Ricardo Costa e a José Gomes Ferreira, na SIC, José Sócrates admitiu a recessão e anunciou que ia rever o Orçamento do Estado. A partir de então, tomou medidas, como a alargamento de 12 para 18 meses do subsídio social de desemprego e o lançamento de um programa de obras em escolas. Uma estratégia que ampliou, no âmbito conjunto das decisões do G20 e da União Europeia, em Abril de 2009.
Se José Sócrates se assumiu como paladino do combate à crise, os partidos políticos da oposição tomaram o tema como bandeira eleitoral. Só que, após as urnas falarem, o assunto desapareceu do palco comunicacional. Isto quando aparentemente nada de substancial mudou. A situação internacional mantém-se. Os indicadores económicos não revelam uma recuperação fulgurante. O desemprego agrava-se. O primeiro-ministro é o mesmo.
"No contexto pós-eleitoral que estamos a viver, é normal que não se fale", explica Rui Serôdio, acrescentando que, "no pico da crise, em Abril e Maio, as pessoas sentiam mais o assunto e estavam preocupadas com os seus e consigo mesmas". Mas, "com o período eleitoral, as pessoas tiveram que tomar a decisão sobre em quem votar". Logo, quem é "afecto a um partido e tiver uma identidade com um partido, tende a calar as críticas".
A nova mesa de café
Rui Serôdio alerta para que, além da situação individual de "quem votou no PS não poder falar da crise", verifica-se ainda o alastrar deste bloqueio ao nível da formação de opinião. Isto porque, garante, "hoje em dia, as conversas de café são a televisão, a TV é o interlocutor através do qual formamos opinião, e quando chega o momento eleitoral, nessas conversas, ou seja, na TV, não há espaço para críticas, porque analistas e observadores e comentadores também votam".
( Aqui um parenteses, para lembrar como numa cidade média, a mesa de um café pode ser determinante, tanto mais como já Santos Costa o ministro da Defesa de Salazar, desde 1944, avisadamente defendia, numa carta a Salazar, em 1958, " neste país sem consistência nem consciência política, ter consigo a tropa é ter praticamente tudo".
Englobe-se hoje na "tropa", os quatro milhões de portugueses que recebem mensalidades do Estado, - nesta democracia eleitoralista -como Medina Carreira não deixa de quantificar e veja como o "coorporativismo" perdurou...)
Mas este silêncio será sol de pouca dura, prevê Rui Serôdio, que considera que a situação não é para tratamento psicológico. "Daqui por dois ou três meses, se o Governo estiver em funções, se a crise não melhorar, se o desemprego não diminuir, se o poder de compra não aumentar, volta-se a falar de crise, porque já não se está num momento identitário de voto.»
A ILUSÃO de DEMOCRACIA no SEU MELHOR...