Pelas ruas do Souto, já os homens haviam partido para Lisboa ou ido rebuscar nos tabuleiros escavados nas vertentes mais soalheiras das encostas o sustento do dia seguinte e um bater ritmado ecoava pelas ruas fora, de um lado, porta sim, porta não, do outro lado, era tudo a eito.
Um braço do tear com a mão da tecedeira fazia esse vai-vem para ajustar os fios, batê-los e rebatê-los para ficarem muito mais juntinhos. O braço do tear guiado pelos pentes que deslzavam sobre milhares de fios bem esticados fazia esse batimento ritmado. O braço chamava-se a queixa. A queixa fazia barulho. A queixa ecoava. Mas ninguém se queixava daquele barulho. Aquele barulho era vida. Tecer era urdir. Urdidas as teias, novas encomendas se seguiam. Havia essa certeza a pairar sobre o futuro. E ao final do dia chegavam os homens a casa. Traziam pouco. Mas traziam certezas, como as certezas que viam crescer em suas casas.
No dia seguinte iam procurar e cavar mais sustento. Vinha aos poucos. Era certo, como o eco do bater da queixa que se fazia ouvir pelas ruas do Souto.
Hoje, as janelas já não se abrem. As portas são blindadas, têm a fechadura mais forte, e não deixam ver mais, a chave pendurada entre a partida e a chegada dos donos.Os donos levaram-nas com eles. Não voltaram ao fim do dia. E o ecoar da queixa, não se fez ouvir mais.
Não há gente pelas ruas, as portas não se abriram e o sol já não entra pelas janelas de onde ecoavam as queixas. Não há queixas no Souto. Há uma placa: aberta das 14.00 horas às 16.00 horas. Mas só vale para os sábados. É a junta de freguesia, quem o afirma com a necessária autoridade, que o Souto consente. Não se ouvem mais queixas.