«Portugal aderiu à UE em 1986, era então primeiro-ministro o actual Presidente da República, e assim continuaria nos dez anos seguintes, quando todas as principais instituições que caracterizam hoje a UE foram definidas, como o Mercado Único Europeu e a Moeda Única (Euro).
O diagnóstico que então foi feito de Portugal pelos responsáveis europeus e pelos dirigentes políticos nacionais foi o seguinte. Portugal tinha então uma elevada percentagem do PIB e da população activa na agricultura e nas pescas. E isso era considerado próprio de uma país "atrasado". A indústria portuguesa era, então, constituída predominantemente por indústrias tradicionais, como os têxteis, o vestuário, o calçado, a metalomecânica, etc. E isso era também considerado "atrasado". Portugal tinha também uma produtividade do trabalho inferior à média da União Europeia, e esse era mais um sinal de um país "atrasado". E o escudo, que era uma moeda forte até 1974, tinha desvalorizado fortemente até 1986, devido aos desmandos da governação democrática (que entretanto recorrera por duas vezes à ajuda do FMI). E este era também um sintoma de que o país estava "atrasado".
A UE deu-nos então dinheiro para reduzir o peso da agricultura e das pescas na economia, pagando aos agricultores e aos pescadores para ficarem em casa, ao mesmo tempo que os excedentes agrícolas dos países do Norte da Europa invadiam o mercado nacional. Quanto às indústrias tradicionais, como os têxteis, o vestuário e o calçado, dava-se cabo delas abrindo-as à concorrência no espaço do Mercado Único Europeu, e mais ainda, à globalização, permitindo que os chineses as substituíssem.
Ao mesmo tempo, a UE dava-nos dinheiro para aumentar a produtividade, financiando a construção de estradas, portos, pontes, aeroportos e também a educação e a formação profissional. Esperava-se que a população activa agora liberta da agricultura, das pescas, dos têxteis, do vestuário e do calçado, se reconvertesse para sectores mais modernos, talvez a biotecnologia ou a engenharia espacial. Assim modernizados, nós poderíamos aguentar uma moeda forte - o Euro.
Tudo isto foi feito com a assinatura e o entusiasmo do Professor Cavaco Silva à frente do Governo. Tudo estava a correr bem. Agora é que iríamos deixar de ser um país "atrasado" (...)
Ele próprio dizia na altura que éramos "o bom aluno da Europa", esta sim, uma manifestação de atraso e subserviência que não lembraria ao diabo.
(...)No ínicio da década de 90, o Governo do Professor Cavaco Silva, tendo como Ministro da Indústria o Engenheiro Mira Amaral, pagou ao famoso Michael Porter uns bons milhares de dólares para ele dizer quais seriam aqueles sectores - a biotecnologia? a engenharia do espaço? as células estaminais? - em que Portugal estava destinado a especializar-se, substituindo a agricultura, as pescas, os têxteis o vestuário e o calçado.
Quando o resultado do estudo foi conhecido, a decepção não podia ser maior. Segundo Porter, Portugal tinha vantagens comparativas era nos têxteis, no vestuário, no calçado, no turismo, nos vinhos e outros produtos agrícolas, nas pescas, no mobiliário, e nos moldes da Marinha Grande - numa palavra, nos seus sectores tradicionais.
Apesar da desilusão, era necessário seguir em frente. E assim fizeram todos os governos portugueses que se seguiram aos do Professor Cavaco Silva, sempre oleados pelos subsídios da UE que permitiam ganhar votos. Até nos conduzirem à situação em que nos encontramos.
E é agora o próprio Professor Cavaco Silva que diz que temos de voltar à agricultura e que precisamos de uma moeda fraca. É preciso ter lata.» by Pedro Arroja, in Portugal Contemporâneo.blogspot.com